Possa ela ao menos ser bela
Não sei. Não sei porque o fiz. Não consigo explicar. Talvez nem haja explicação. Mas alguma tem que haver. Compreender é completar um puzzle a que faltam sempre peças. Mas apesar de tudo temos que tentar. Fazer sentido do pouco sentido que nos resta. Talvez tenha sido por medo. Nem eu sei bem do quê. Há coisas que nos tocam de tal forma que quase nos matam. Às vezes de dor. Outras de prazer. A maior parte delas de ambos ao mesmo tempo. Creio que o fiz para me curar. Na ilusão de que me curaria. Talvez não se escreva por outra razão. E não haja outra razão que nos possa levar a destruir o que escrevemos. A maturidade é perceber que não há cura. Só há processos de cura. E libertarmo-nos deles é voltarmos a cair nos braços da doença. A maior manha do diabo, escreveu o Baudelaire, é convencer-nos que não existe. Dizer estou curado é como dizer estou morto. A vida é uma eterna convalescença. Somos parte desse medo e dessa coragem. Desse desespero e dessa esperança. Não sei porque o fiz. Senti necessidade. Há coisas que não conseguimos entender. Fazemo-las mesmo não as querendo fazer. O pecado é apenas isso. A contradição consigo próprio. Ou melhor: a ilusão de que se resolveu a contradição. De que há um recomeço absoluto, um espaço zero, um perdido paraíso a que é possível voltar. Mas não existe tal coisa. Tudo é apenas continuação, caminho, vida. Estamos aqui porque estamos aqui. Não há explicação para o essencial porque se houvesse ele tornar-se-ia acessório. Só o mistério revela a verdade. Só a verdade explica o enigma. Só o enigma encontra a solução. Só a solução descobre a pergunta. Só a pergunta inventa a resposta. Só a resposta encontra a saída. Só a saída se transforma em entrada. Só a entrada instaura o lugar. Só o lugar preenche o tempo. Só o tempo gera o ser. Só o ser se perde na vida. Só a vida se entrega à morte. Só a morte se dissolve no amor. Só o amor explica o mistério. Só o mistério…
Não sei porque o fiz. Talvez faça parte do mistério. Por vezes temos muito medo e muito frio e nem sabemos explicar porquê. E queimamos o que criámos na tentativa vã e desesperada de nos aquecermos. Dizemos que estamos loucos. E que nos dói. E que se fizermos isto nos curamos. E depois percebemos que não há cura. Que nunca houve. Que tudo o que existe são processos de cura. E que esses fazem sempre parte da nossa loucura. E que é bom que assim seja. Porque assim nem tudo se perde. Nem tudo em nós de nós se perde. E a maior loucura é querer sair dela. Imaginar que há um lugar. Temer as superfícies. Procurar a cura como quem procura se livrar de si próprio. Não sei bem o que estou a escrever. Nunca o soube, mas é talvez assim que escrevo melhor. Quando não quero saber. E deixo sair. E deixo estar. E deixo ficar. E melhor ainda escreverias se aprendesses a guardar. E não fugisses de tudo e de todos sem perceberes que foges apenas de ti. Estava louco. O que queres? Não sei explicar. E talvez seja melhor assim. Não haver explicação. Ou eu não a conseguir encontrar.
No fundo, não há explicação. Para nada há explicação. As coisas são o que são. E nem costumam ser grande coisa. Mas se calhar é melhor assim. Aceitar. A fatalidade das palavras perdidas. Ficam na memória de quem as guardou. Mesmo que já mal lembradas, elas estão lá. Nunca sairão de lá. Mesmo que se confundam com o pó do inconsciente. Ou não se consigam fazer ouvir por entre tantos gritos. Somos feitos de gritos, sabias? Veio-me agora a ideia. Assim sem mais nem menos. Somos feitos de tudo aquilo que gritamos. Mas gritar não é falar mais alto. Gritar é quase sempre cantar. E por isso pode soar doce aos teus ouvidos. Como o perfume impossível de flores extintas. Mas tu respiraste. E eu sei que o ar que partilhámos existe em algum lugar. Mesmo que eu agora só encontre fragmentos. Memórias vagas. Esboços destruídos de rostos risonhos. Alguma coisa aconteceu. Mesmo o que se perde se encontra, senão não o poderíamos ter perdido. Quando choramos ainda rimos. Porque aprendemos a amar a vida. E cada palavra. E o amor que com elas, por elas, e nelas, é possível fazer-se.
Talvez tenha sido apenas uma história de amor. Breve, vaga, estranha. De que se guarda apenas uma memória igualmente breve, vaga e estranha. Possa ela, ao menos, ser bela.
Não sei porque o fiz. Talvez faça parte do mistério. Por vezes temos muito medo e muito frio e nem sabemos explicar porquê. E queimamos o que criámos na tentativa vã e desesperada de nos aquecermos. Dizemos que estamos loucos. E que nos dói. E que se fizermos isto nos curamos. E depois percebemos que não há cura. Que nunca houve. Que tudo o que existe são processos de cura. E que esses fazem sempre parte da nossa loucura. E que é bom que assim seja. Porque assim nem tudo se perde. Nem tudo em nós de nós se perde. E a maior loucura é querer sair dela. Imaginar que há um lugar. Temer as superfícies. Procurar a cura como quem procura se livrar de si próprio. Não sei bem o que estou a escrever. Nunca o soube, mas é talvez assim que escrevo melhor. Quando não quero saber. E deixo sair. E deixo estar. E deixo ficar. E melhor ainda escreverias se aprendesses a guardar. E não fugisses de tudo e de todos sem perceberes que foges apenas de ti. Estava louco. O que queres? Não sei explicar. E talvez seja melhor assim. Não haver explicação. Ou eu não a conseguir encontrar.
No fundo, não há explicação. Para nada há explicação. As coisas são o que são. E nem costumam ser grande coisa. Mas se calhar é melhor assim. Aceitar. A fatalidade das palavras perdidas. Ficam na memória de quem as guardou. Mesmo que já mal lembradas, elas estão lá. Nunca sairão de lá. Mesmo que se confundam com o pó do inconsciente. Ou não se consigam fazer ouvir por entre tantos gritos. Somos feitos de gritos, sabias? Veio-me agora a ideia. Assim sem mais nem menos. Somos feitos de tudo aquilo que gritamos. Mas gritar não é falar mais alto. Gritar é quase sempre cantar. E por isso pode soar doce aos teus ouvidos. Como o perfume impossível de flores extintas. Mas tu respiraste. E eu sei que o ar que partilhámos existe em algum lugar. Mesmo que eu agora só encontre fragmentos. Memórias vagas. Esboços destruídos de rostos risonhos. Alguma coisa aconteceu. Mesmo o que se perde se encontra, senão não o poderíamos ter perdido. Quando choramos ainda rimos. Porque aprendemos a amar a vida. E cada palavra. E o amor que com elas, por elas, e nelas, é possível fazer-se.
Talvez tenha sido apenas uma história de amor. Breve, vaga, estranha. De que se guarda apenas uma memória igualmente breve, vaga e estranha. Possa ela, ao menos, ser bela.
4 comments:
" E não haja outra razão que nos possa levar a destruir o que escrevemos."
que pena que apagaste. que bom reler destroços. belos.
Belíssimo texto.
Tremendamente triste, tremendamente belo. ;)
Apetece-me chorar.
(...)
Podia dizer-te tudo, que te enganas, que estás enganado, mas é nas tuas palavras que me encontro e te encontro.
E é tão bom encontrar-me, encontrar-te, encontrar-nos...
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