Alice II
I
Alice nasceu num dia de Primavera. A sua mãe abriu as pernas e Alice saiu da toca. A sua mãe estava habituada a abrir as pernas. Por motivos profissionais. Mas era a primeira vez que as abria para gerar vida. Por incrível que pareça, Alice tinha um pai e este estava identificado. Era quem geria o negócio da mãe. Quando Alice nasceu o sol brilhava e a natureza estava em flor. A mãe quando a contemplou pela primeira vez disse que ela era bonita. E o pai, olho no negócio, disse que era verdade, que a miúda tinha futuro. Era preciso era cuidado, para não a danificar. Usar sim, que é direito que assiste a quem educa, mas abusar não. Alice foi gerada por acidente. Nunca ficou muito bem esclarecido como, mas o certo é que escapou àquele que seria o seu destino natural: o aborto. os pais de Alice, sabe-se lá porque milagre, perderam a cabeça e decidiram que o acidente iria até ao fim. A mãe, claro, ficou feliz como todas as mamãs. Não deixou de fumar nem de beber. E enquanto pôde continuou a trabalhar, que a vida não está para brincadeiras e luxos é para quem pode, não para quem fode, como modo de ganhar a vida. O pai rezou todos os dias para que o acidente fosse menina. Forma de ampliar o negócio familiar. E para que Alice se habituasse de cedo ao seu futuro começou logo a chamar-lhe puta precocemente. Mimos de pai babado. Quem o poderá censurar? Alice não se pode queixar. Tem um papá e uma mamã. Nem todas as crianças podem dizer o mesmo. Que algumas nem família têm. Alice teve amor e um lar onde pôde crescer e ser feliz. É verdade que caiu muitas vezes, foi contra as portas, danificou o seu corpo de criança. Mas a senhora doutora, que estudou na universidade e não se deixa enganar, sabe bem que das escoriações no corpo de Alice a porta está inocente. Tudo isto é fruto do amor paternal e maternal. Mais od paternal do que do maternal, é certo. Mas apenas porque o pai tem a mão mais pesada e melhor pontaria do que a mãe. Raio da miúda é endiabrada e consegue fugir das ternurentas investidas da mamã. Mas do papá ninguém escapa. Nem mesmo a mamã que de vez em quando também leva pela medida certa, maneira outra de dizer que recebe o que merece, Mas com a mamã é preciso mais cuidado. Usar de menos ternura. Não vá o negócio ressentir-se. Alice, por enquanto, ainda é um investimento a médio prazo. Mas com a idade é preciso reduzir na ternura. As crianças, mesmo as muito amadas, não devem ser mimadas. E quando a mulher começar a florir (linda metáfora para a filha da Primavera) é porque está na altura certa para começar. Entretanto vai aprendendo com o papá. Que amorosamente tudo ensina à sua filha querida.
II
Esta é a casa do fantasma. Aqui não podes ficar muito tempo. Aqui só ele habita. Mais ninguém. Podes vir sempre que quiseres. Ficar o tempo que for necessário. Mas não deves abusar. Não é bom andar na companhia dos fantasmas. Eles não sabem o que fazem nem compreendem o que fizeram. Julgam-se inocentes, livres, perdoados. Imaginam que agora tudo acabou. Que tudo sarou. Que o que foi deixou de ser e que o presente nada guardou do passado. Os fantasmas nunca se arrependem. Acham que não vale a pena. Que já não é necessário. Que o esquecimento já apagou tudo. Mas esta é a casa do fantasma. Aqui tu ouves vozes. Vês sombras de outros tempos. E tens medo. Aqui tu temes a hora da chegada do pai. Aqui tu temes as palavras doces. Aqui tu temes a mão que te sobe pelas pernas. Aqui tu temes as mentiras do amor. Aqui tu temes a violação original. Aqui tu temes o corpo, o sangue, a vida. Aqui tu temes tudo porque tudo te foi tirado. Porque nada é o que parece e tudo parece o que não é. Aqui a vida não abençoa a vida. E o futuro rasga o passado deixando marcas indeléveis de dor e sofrimento. Aqui a fenda sagrada transforma-se em cicatriz. Aqui o sangue escorre e a inocência agoniza. O perdão é uma coisa. O esquecimento é outra. E os fantasmas julgam que se pode esquecer sem perdoar. Lá no mundo sem corpo em que vivem não entendem estas marcas que deixaram. Estes espinhos cravados na carne tenra. Esta morte sem remissão. Os fantasmas não sabem nada. Não podem saber. Nem do mal que fizeram nem do bem que poderiam ter feito. Os fantasmas não existem nem possuem realidade. Mas isto que tu sentes invadir-te o corpo. Isto que rasga, maltrata, destrói. Isto que um dia aprenderias ser afinal objecto de prazer. Isto existe demasiado. Cravou-se dentro de ti e já não há forma de o expulsar. A não ser quando ficas assim. Sozinha. Olhando o vazio. Então alguma coisa se dissolve dentro de ti. E inunda-te. É um jorro quente que um dia tentarão te convencer que é o elixir da vida. Seria para rir, se não fosse para chorar.
Não me toques
Não me toques
Não me toques
Não me toques
Não me toques
Alice
Alice
Alice
Alice
Alice
Alice
A
l
i
c
e
III
Mas que merda é esta? Quem te dá o direito de fazeres isto? De me expores, de escreveres sobre mim, de me apresentares como produto da tua imaginação? Com que direito o fazes? Gostavas que fizesse o mesmo contigo? Seria bonito, não seria? Para variar. Conheço-te bem. Escreves para fugir. Escreves para te esconder. Escreves para fingir. Mas eu não tenho nada a ver com isso. Quero lá saber dos problemas que tens na cabeça. Quero lá saber se precisas disto como quem precisa de uma droga. Não tens o direito de me usar. Não tens o direito de fazer isso. Escreve sobre ti. Bem sei que há pouco a dizer, não é? A tua vida, no fundo, não tem interesse nenhum. Nunca teve. Mas a culpa é tua. Nâo me puxes a mim para o teu naufrágio. Para as tuas angústias de bolso e para os teus medos patéticos. Eu não tenho que aturar isso. Não tenho que fazer parte do jogo. Estou cansada da puta da tristeza. Dos lamentos de merda. Das pessoas que se arrastam e se lastimam. Sim, falo de ti. Sabe bem ser exposto, não sabe? Mas expor os outros não te dá problemas. Alice isto, Alice aquilo. Alice nasceu assim e vive assado. Deixa-me em paz. estou farta desta merda toda. E não, não penses que vou chorar. Seria uma vitória para ti, não seria? O teu silêncio levar-me às lágrimas. Obrigar-me a cair nos teus braços. Soluçar. Dizer que estou perdida. Implorar-te ajuda. Puta que te pariu! É prazer que não te darei. Disso podes ter a certeza. Sou mais forte do que tu. Sempre fui e sempre serei. Não preciso de ti para nada. O fraco aqui és tu. E por isso escreves da forma que escreves. Afundas-te nesse aquário redondo que tu próprio criaste e onde imaginas estar preso. Delirante. É isso que és. Ou apenas amedrontado. Deve ser isso. Delirante é muito para ti, não é? Sem querer ainda te fazia um elogio. Olha a tua sorte. Estou farta de pessoas que só se queixam. Que não fazem nada e dizem que está tudo mal. Farta do conforto do bláblá. Conforto sim, é sempre conforto. uma boa desculpa, o faz de conta, o talvez, pois, bem, não sei. Que se foda esta merda toda. Ainda por cima estou a escrever. Raio de doença. Deve pegar-se. Como uma epedimia. Ao menos não uso floreados, nem imagens poéticas, nem truques literários, nem essa patranhada toda com a qual iludimos a verdade e fazemos de conta que ainda há salvação. Mas não há, ouviste? Não há. Esta merda está toda fodida e já não há como sair daqui.
3 comments:
jctp,
Parte deste texto já conhecia, lembras-te? Já o tinhas publicado...
...
Sinceramente não sei o que comentar.
Tudo o que (des)escreves é sórdido e retrata muita dor, toda a dor... se é que há um limite para o sofrimento humano - o que eu duvido.
Se te escreves a ti ou a um outro/a, não sei...
Tão pouco sei como é possível perdoar, embora esse seja o único caminho transformador.
Eis-te então homem ou mulher, como queiras, ao invés de fantasma.
Olha, podes começar por aprender que nem toda a gente toca para magoar, possuir ou violar.
Mas tu sabes isso, não sabes?
...
E se brincas, jctp, deixa de o fazer... (e nem me vou dar ao trabalho de te explicar as razões).
...
Lamento se não estou à altura, mas sou só uma estrela do mar.
E não me vou zangar mais, já te tinha dito.
Beijo
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