Alice, coelhos e relógios
Tenho saudades da Alice, pensava o coelho, enquanto olhava para o relógio, mais pela força do hábito do que por estar atrasado, pois não tinha que ir a nenhum lado, ou por esperar alguém. Ela costumava cá vir, descer à caverna, passava horas comigo, por vezes fazia de conta que não estava, e talvez não estivesse mesmo, mas eu fazia ainda mais de conta do que ela que ela estava onde fingia não estar. Mas agora não tem resultado, mesmo que eu finja que ela ainda está, ela já não está. Nem sequer se despediu, Alice. Um dia estava e no outro já não. Como se a sua ausência fosse tão natural como a sua presença. Um dia eu apago-me, mas continuarei aqui, perto de ti, porque um dia aqui estive, e por isso estarei mesmo quando já não estiver, e onde tu estás eu também estou, mesmo que tu já lá não estejas. Por vezes ainda vou ao lugar onde a encontrei. Ou melhor seria dizer ao lugar onde ela me encontrou. Porque foi ela que me seguiu, que desceu a toca, que se perdeu comigo no escuro anterior ao mundo que a terra guarda dentro de si.
O meu relógio avariou-se, parou, os ponteiros já não fazem sentido, perderam o norte, naufragam perdidos no labirinto das horas. A Duquesa bem pode esperar. Talvez até já se tenha cansado de esperar. Talvez este já nem seja o tempo da espera. Mary Ann sorri para mim, canta-me canções de amor, diz-me que os coelhos ainda têm futuro e que a Rainha de Copas vai perder a guerra. Mais tarde ou mais cedo.
Diz-me, Alice, diz-me como pode um pobre e simples coelho vencer uma guerra tão fria sem o calor da tua presença? Quem me dera que estivesses aqui (ainda).
O meu relógio avariou-se, parou, os ponteiros já não fazem sentido, perderam o norte, naufragam perdidos no labirinto das horas. A Duquesa bem pode esperar. Talvez até já se tenha cansado de esperar. Talvez este já nem seja o tempo da espera. Mary Ann sorri para mim, canta-me canções de amor, diz-me que os coelhos ainda têm futuro e que a Rainha de Copas vai perder a guerra. Mais tarde ou mais cedo.
Diz-me, Alice, diz-me como pode um pobre e simples coelho vencer uma guerra tão fria sem o calor da tua presença? Quem me dera que estivesses aqui (ainda).